Um dos points mais loucos de SP, Bar do Netão está de volta na mesma rua Augusta

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Por music non stop

TEXTO POR GIL RIQUERME
FOTOS ACERVO BAR DO NETÃO E FESTA POSH

É engraçado como as coisas acontecem neste mundo. Eu nunca imaginaria que a reunião de cinco amigos festeiros, lá nos idos de 2008, e um bar tosco na Rua Augusta iria mudar tanto os rumos da noite underground de São Paulo.

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Gil Riquerme e a turma da PoSH

Sou DJ desde 2002 e já discotecava e fazia minhas festinhas no underground lá em Curitiba. Fazia alguns meses que estava morando em São Paulo, dividia apartamento com meu irmão, o DJ Neto Niggaz, e estávamos animadíssimos com o mundo de possibilidades que a nova metrópole nos oferecia. A gente queria tocar e fazer uma nova festa aqui em São Paulo. Mas, claro… Nada era muito fácil, éramos novatos na cena e não existiam oportunidades.

TORRE DE QUINTA, A FESTA DEBUT! ERA O LUGAR MAIS FERVIDO DE SP HÁ 10 ANOS

Até que um dia, o Neto Niggaz voltou animadíssimo de uma noite num boteco tosco da Rua Augusta me falando que ele tinha ido parar numa festinha com um som mara e conhecido pessoas incríveis! Sim, era o Bar do Netão nos seus primórdios. A “pista de dança” tinha sido improvisada onde antes havia uma mesa de sinuca, a festinha tinha sido organizada pela Cuca pra uma amiga que estava de aniversário e o André Laface era o DJ – eles já tinham feito algumas festinhas ali a convite do dono, o famoso Netão!

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Netão, o famoso dono do boteco que foi o embrião de festas como Capslock e VoodooHop

Bingo! Estava se formando a partir daí um embrião da nova cena, e a primeira formação dos PoSHers: André Laface, Cuca Couto, Neto Niggaz e Gil Riquerme. O Neto já tratou de marcar uma reunião com os novos amigos, a Cuca e o Laface, para levar adiante aquela idéia de uma festinha para amigos nesse bar. Lembro muito bem do dia em que os conheci, animadíssimos em uma reunião ali, no clássico Rotisserie Bologna, na própria Rua Augusta! E foi incrível como nos demos muito bem desde esse primeiro encontro, tanto que somos amigos até hoje. E ali mesmo já decidimos tudo, inclusive o nome do projeto: PoSH, que nada mais era que uma piada com o fato de, na época, ser num lugar pequeno, sem estrutura, numa rua duvidosa de São Paulo, cheia de puteiros e vários personagens de “má fama”.

O COMEÇO

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Sim, até cachorro frequentava o Bar do Netão nos idos de 2008

Naquela época, aquele lado da Rua Augusta estava começando a se tornar cool: o Clube Vegas já fervia e trazia os clubbers para onde antes só tinham puteiros decadentes, bêbados, traficantes, héteros que vinham se aventurar pela rua em busca de diversão com as meninas. Tudo co-existia pacificamente. Era cool estar daquele lado da Rua Augusta, andar por entre os luminosos das casas estilo “american bar” e ser abordado por “laçadores” que ofereciam os serviços das meninas ao gritos!

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Os flyers da PoSH eram abusados

Então acertamos com o Netão que a festa seria semanal, aos sábados. Já tínhamos os DJs, mas faltava alguém pra promover. Eu tinha recém conhecido o Tiaguinho Santos, na época ele era gerente do antigo Astronete Bar, já frequentava a Rua Augusta, conhecia muita gente e topou entrar pro clã como promoter e fotógrafo. Existem fotos antológicas do Tiaguinho na página da PoSH no Facebook, ele captava muito bem a essência do bar e da festinha.

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O que dizer deste flyer com o próprio Netão projetado na fachada do bar?

Éramos cinco DJs (alguns meses mais tarde entra para o clã a curitibana GizEye Lashes), então a sonoridade da noite era super eclética e abrangia muita coisa, o que acabava agradando várias tribos, que no decorrer da noite se alternavam entre a pistinha e a calçada em frente. As divas pop, que na época estavam começando a bombar, Lady Gaga, por exemplo, ouvi a primeira vez numa PoSH quando GizEye soltou Poker Face, que se tornou hit instantâneo, claro! Ao mesmo tempo ela soltava uns electros nervosíssimos. Tinha a sonoridade electrorock com a Cuca, músicas que viraram sinônimo da PoSH. Tinha muito rap, hip hop, booty, trap com os hits do Neto Niggaz, momentos de safadeza e muito twerk e mais pro final da noite vinham as tracks de nu disco, electrohouse, minimal e techno que eu e o André Laface colocávamos. Era a hora da loucurinha com muito estrobo e muita máquina de fumaça na pistinha, a hora das paredes do Bar do Netão suarem!

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A pista suarenta do Bar do Netão, com seu micro globinho no teto

Sempre chamávamos um DJ convidado que tanto poderia ser uma estrela, ou um amigo, um performer, uma drag. O som ia até as sete da manhã, quando a Marta, a barwomam, dava gritos no balcão do bar mandando desligar o som! Depois da noite, um clássico era descer a Rua Augusta, com as loucas, as montadas, as freaks e ir comer um pastel na feirinha da Praça Roosevelt chocando as senhorinhas.

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Causacione no Bar do Netão: gente descolada, tatuada, modernérrima

Com o sucesso das noites de sábado, o bar começou a abrir outros dias da semana, com outras sonoridades e com diferentes promoters e DJs: nas sextas acontecia a VoodooHop com o Thomas, também recém-chegado a São Paulo, apresentado ao Netão pelo Tiaguinho. Às quintas, a noite era comandada pelo Cacá Toledo e DJ Kid, o Gui Fogagnoli. Às quartas, tinha ritmos brasileiros com o Chico Leibholz.

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Calçada bombando de gente, e lá dentro, a pista também

De repente o minúsculo Bar do Netão virou point de várias tribos e referência de noite divertida e louca. As pessoas iam pra lá pra encontrar amigos, ficar bebericando na calçada, se acabar na pistinha, se amontoar no banheiro enlameado. Tudo era um acontecimento.

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Pera que vou dar uma performadinha ali no Bar do Netão

Performances aconteciam dentro do bar, muito vezes indo parar na rua! Fórster, Volatile e Fancy Guy eram nossos performers oficiais, sempre absurdos! Carros eram parados, tinha buzinaço, uma loucura. Muitas pessoas ficavam numa procissão que foi apelidada de “Triângulo das Bermudas” pelo saudoso Vitor Angelo: dançavam no Bar do Netão, bebiam no Bar do Matão em frente e também no Ecléticos Bar, ao lado, onde o preço da cerveja era mais em conta!

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Uma saudade: Vitor Angelo (dir.) causando na calçada do Bar do Netão

LEGADO

O Bar do Netão foi o embrião para as festas de rua que vieram a seguir, quando a especulação imobiliária tomou conta da Rua Augusta. Foi do Bar do Netão que saiu o novo underground de São Paulo: o Thomas da Voodoo Hop começou tocando por lá, depois veio a Capslock e todas essas outras festas que hoje acontecem em galpões. O Bar do Netão ajudou na gestação dessa nova geração de DJs, promoters e performers que hoje movimentam a atual cena.

A PRINCESA E O VAGABUNDO

A Rua Augusta de repente começou a ser hype. A fama do bar do Netão começou a crescer, e a gente percebia que não tinha um público específico, era uma mistura muito louca de pessoas de diferentes classes sociais, níveis e credos… E o diferencial do Bar do Netão era justamente ser um local aberto, onde as pessoas não precisavam pagar para entrar, o som vazava para a calçada, um lugar muito democrático, difícil de ser rotulado. Tanto é que a maioria das vezes tinha tanta gente pela calçada e invadindo a rua que praticamente os carros não conseguiam passar: a festa acontecia também na rua.

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Cenas de uma noite como outra qualquer no Bar do Netão

Volta e meia apareciam globais, celebridades, subcelebridades, pessoas atraídas pela fama do bar. Lembro-me de um episódio que ilustrava muito bem esse ecletismo: teve uma noite fria de inverno, tudo superlotado, a pistinha, o bar a rua… e na calçada estava a nossa princesa a Paola de Orleans, conversando e se divertindo com amigos e lá dentro, na pistinha, um mendigo enrolado num cobertor que fedia horrores dançando muito na pistinha! Era uma balada tão eclética que todos iam: da princesa ao vagabundo!

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Vou segurar esta parede que a próxima track vai botar o Netão na chón

A PoSH e o Bar do Netão são sinônimos: nasceram juntos e assim ficaram até o bar ser fechado pela especulação imobiliária na Rua Augusta dois anos e meio depois. A gente tocava todo sábado, nunca deixou de acontecer. Ufa! Era cansativo, mas era incrível! Tudo podia acontecer numa noite no Bar do Netão. E todo mundo que frequentou tem uma história, um bafão pra contar! A noite era despretenciosa, libertária, anarquista, muitas pessoas legais envolvidas, DJs muito bons, performers absurdos, e-flyers divertidos, fotos ótimas. Noutro dia havia muitas histórias absurdas para contar!

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Catuaba + Bar do Netão + PoSH + juventude a fim de farra = <3

O Bar do Netão ficou conhecido rapidamente e o hype se espalhou rápido. Os DJs da PoSH eram convidados a tocar em grandes clubes da nossa capital e até de outros estados. A festa bombava todos os finais semana, as pessoas ficavam loucas, criavam personas exclusivamente para se jogar na minúscula pistinha do inferninho que sempre ia até o sol raiar. Foi a primeira festa do famigerado Bar do Netão, o qual até então era apenas um botequim de fim de noite, com um par de mesas e uma mesa de sinuca no subsolo. Nós no divertimos muito durante esses dois anos e nossas fotos comprovam isso. Apostamos que cada uma das pessoas que por lá estiveram tem também uma boa história pra contar! Hoje esta história recomeça, com a reabertura do Bar do Netão, em novo endereço (onde funcionava o Caos), mas ainda na Augusta. Nos vemos na pistinha.

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BAR DO NETÃO
Reabertura sexta, 7/10, a partir das 21h
Festa #Pista1
Line-up: Eristhal Luz (pocket show), Chico Leibholz, Daniel Gomes, Missin Link, Cacá Toledo e Sergio Barbo
Rua Augusta, 584 (antigo Caos)
(11) 2501-5049

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